Olhão, 21 de Junho de 2013
À
Agencia Portuguesa de
Ambiente
Rua da Murgueira, nº 9-9ª –
Zambujal
2611-865 Amadora
Assunto:
participação na discussão publica do Plano de Acção para a Valorização
Hidrodinâmica da Ria Formosa e Mitigação do Risco nas Ilhas Barreira.
A
primeira grande questão que se levanta, é que para alem da exiguidade do prazo
para a participação do publico na presente discussão publica, a falta de
divulgação e de publicitação por parte das entidades envolvidas, nomeadamente a
Sociedade Polis Litoral da Ria Formosa enquanto promotora da intervenção,
parece esconder os objectivos finais do Plano ora em discussão. Sem
publicitação, o publico em geral e os pescadores e moluscicultores em
particular e principal parte interessada, desconhece a existência da discussão
e do que se pretende fazer.
Em
segundo lugar para dizer que a área a intervencionar foi objecto de uma outra
intervenção semelhante mas mais profunda, nos finais da década de noventa do
século passado, e que decorridos uma escassa meia dúzia de anos se sentisse a
necessidade de uma nova acção, o que é demonstrativo de que as dragagens, se
não forem acompanhadas de medidas complementares, também hoje não previstas,
passado um ano voltaremos a ser confrontados com a necessidade de novas
intervenções.
Não
é estabelecida a relação causa/efeito da degradação do sistema dunar que forma
as ilhas barreira, assim como o Resumo Não técnico apresenta contradições pouco
compatíveis com a qualidade ambiental das aguas da Ria Formosa.
A
degradação do sistema dunar da Ria Formosa está associado à construção das
barras artificiais, aos esporões de Quarteira, aos molhes da Marina de
Vilamoura, que impedem que as areias circulem livremente, acumulando-se a
poente daquelas infra-estruturas e causando um défice das mesmas a nascente.
As
barras naturais migram em media à velocidade de 60 a 70 metros por ano e
quando chegadas ao ponto limite, associadas ao seu assoreamento, num momento de
conjugação de vendaval forte com o preia-mar de aguas equinociais, abrem
novamente no seu ponto de origem. Esta acção é acompanhada de galgamentos
oceânicos com espraiamento das areia para o interior da laguna.
Para
garantir o normal funcionamento das barras naturais, assegurar as condições de
navegabilidade e permitir a constante renovação de aguas seria crucial a sua
fixação com recurso a mangas de geo-texteis cheias com as areias dragadas, o
que ainda assim requeria um plano de dragagens regulares pluri-anual de custos
reduzidos. Este tipo de intervenção não foi equacionado quando representaria
uma mais valia para quem vive da pequena pesca e do marisqueio, actividades
tradicionais da Ria Formosa.
De
igual modo seria mais sensato como medida de mitigação da erosão do cordão
dunar, que as areia provenientes das dragagens servissem para encher mangas de
geo-texteis, criando um conjunto de recifes artificiais multi-funcionais,
dispostos paralelos à linha de costa e a uma distancia desta de cerca de
trezentos metros, por forma a que a alteração da energia das ondas naturalmente
enchesse as praias, reforçando assim o cordão dunar.
Analisando
o projecto constamos que é considerada como a intervenção prioritária a de
Tavira, com o qual discordamos desde logo. E discordamos porque se na Paria de
Faro o risco de galgamento é elevado e susceptível de pôr em causa a segurança
das pessoas e bens de quem ali habita, a intervenção de Cacela, considerada a
de menor prioridade, é absurda porque o que está em causa é o património
histórico secular, edificado no Sitio da Igreja, que devido aos últimos
galgamentos corre o risco de ver as aguas oceânicas chegarem à base da barreira
de arenite e provocar o seu desmoronamento, arrastando consigo o Forte, a
Igreja e o Cemitério.
Mais,
considerar que a intervenção de Tavira é prioritária por correr o risco de
ruptura, quando em Cacela essa ruptura já se deu há cerca de três anos e não lhe
atribuir o mesmo nível de prioridade, é demonstrativo que outros valores se
levantam.
E
tanto assim é que, a Barra da Fuzeta se apresenta também ela assoreada com os
barcos de um pouco mais de calado apenas podem navegar em preia-mar.
A
intervenção da Armona também tem o seu quê de bizarro e inaceitável, porque
como se diz anteriormente, são os molhes da barra Faro/Olhão que impedem a
circulação de areias para nascente, ou seja as areias ficam retidas junto ao
molhe poente, aumentando de forma significativa a largura da Ilha Deserta.
Retirar a areia dos canais da barra da Armona, Culatra-Armona, Esteiro da Barra
Grande e Zona Interior do delta de vazante da Barra da Armona para o depositar
na Praia de Faro, sem acautelar o alargamento e altura de todo o cordão dunar
da Ilha do Farol, de onde aquelas areias são naturais, é promover num futuro
próximo o galgamento oeanico em qualquer ponto da ilha.
Ainda
sobre a intervenção de Cacela, onde são apontadas duas opções, constatamos a
falta de rigor cientifico no estudo. A barra original de Cacela situa-se a
poente da Ribeira do Lacem que lhe deu o nome. Ora não faz qualquer sentido que
a barra do Lacem não seja ali relocalizada, mas até nisso se verifica um erro
crasso do estudo, quando na opção A se mantêm as duas barras o que como se sabe
é contra-procedente, tão contra-procedente que aquando do episodio da intervenção
na Barra da Fuzeta, fecharam uma das duas para que não concorressem entre si.
Ambas
opções prevêem a continuidade da barra do Forte que como se viu nos últimos tem
sido problemática mal se compreendendo porque a Sociedade Polis Litoral da Ria
Formosa faz tanta questão de a manter, sendo que não traz qualquer melhoria
ambiental nem para a Península de Cacela, pelo contrario, nem para o sistema
lagunar, e que só a subordinação a outros interesses a justificam, até porque só
foi aberta por encomenda e sem qualquer estudo prévio.
Também
no ponto 8 do Resumo Não Técnico surgem contradições. É que por um lado diz-se
que as aguas subterrâneas, apesar de servirem para o abastecimento das
populações e infra-estruturas turísticas, são de fraca qualidade relacionada
sobretudo com a presença de poluentes com origem nos esgotos urbanos, para no
paragrafo seguinte dizer que a qualidade das aguas superficiais da Ria Formosa
serem classificadas entre boa e excelente. Significa isto que a poluição
provocadas pelos esgotos urbanos contamina as aguas profundas mas não
contaminam as aguas de superfície onde são despejadas, o que se nos afigura
como aberrante e criminoso.
Aliás, a Agencia Portuguesa do Ambiente ao
assumir as responsabilidades inerentes ao ex-INAG já deveria ter classificado a
Ria Formosa como Zona Sensível Sujeita a
Eutrofização, o que não fez, resultante da sua dupla função de fiscal de si
própria.
Ainda
no ponto 8, a
paginas treze do Resumo Não Técnico, ultimo paragrafo, pode ler-se que a
qualidade do ar é em regra geral boa, havendo alguns casos de poluição pelo tráfego
marítimo nos canais de navegação, mas não dedica um só palavra à poluição
provocada pela libertação do gás metano produzido nas ETAR, o que obviamente
sugere uma oportunidade de branquear o mau ambiente na Ria Formosa.
No
ponto 8, pode ler-se que a intervenção de Cacela poderá ter um impacto muito
significativo na vegetação do cordão dunar, omitindo-se que a maior parte
daquela vegetação desapareceu com a ocorrência dos galgamentos oceânicos,
apresentando-se este Resumo Não Técnico com uma forma de justificar a não
intervenção no cordão dunar de Cacela, apostando na manutenção da barra do
Forte, A opção está pois, feita e decidida, e representa mais um atentado
ambiental contra a Ria Formosa e a população de Cacela.
O
ultimo paragrafo do ponto 9, mostra a total incapacidade, incompetência mesmo,
patenteada em todo o Resumo Não Técnico. Ali pode ler-se que: “Relativamente
aos bivalves, espera-se que a melhoria na circulação de agua na laguna, se
traduza, num impacto positivo, por potenciar um aumento da quantidade de
alimento disponível. Poderá no entanto ocorrer um efeito negativo devido ao
aumento da troca de agua proveniente da área costeira, a qual poderá
transportar para o interior da laguna doenças, larvas e espécies invasivas.”
Quem elaborou este Resumo Não Técnico o que demonstra é não perceber nad da Ria
Formosa, uma vez que a importancia da circulação de agua na Ria tem sobretudo a
ver com os níveis de oxigénio
e
temperatura dentro da Ria e não com o alimento. O provável efeito negativo da
troca de aguas oceânicas, tem a ver com uma maior presença das biotoxinas
marinhas, provocadas pelo retorno do fitoplancton potencialmente toxigeno
descarregado pelas ETAR, que em contacto com as aguas límpidas e cristalinas do
oceano poderão “florar”.
Mas
também a este propósito, lembramos que apesar das intervenções feitas no final
da década de noventa, logo em 2001,
a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional,
encomendou ao CIMA uma monitorização das aguas da Ria Formosa e do impacto
provocado pelas descargas das ETAR. Significava isso que as dragagens, embora
representassem alguma melhoria na qualidade ambiental das aguas lagunares, não
era bastante para a redução dos níveis de poluição na Ria Formosa, tal como as
intervenções previstas terão o mesmo ou menor impacto, até pela sua dimensão,
inferior à anterior.
Verificamos
também que não foram incorporadas nenhuma das propostas apreciadas em sede da
Comissão Parlamentar de Ambiente e constantes do Relatorio Final sobre a Petição
nº 123/XII/1ª, o que lamentamos.
CONCLUSÃO:
As
dragagens previstas, no geral, apresentam aspectos positivos, não tanto como os
que são apontados, mas ainda assim positivos para a Hidrodinâmica da Ria
Formosa.
As
opções de Cacela estão mal fundamentadas, sem o mínimo rigor cientifico, quer
do ponto de vista da mitigação de riscos do cordão dunar, quer do ponto de
vista da Hidrodinâmica.
Ainda
em termos de Hidrodinâmica mal se compreenderá que outras zonas tão importantes como a Fuzeta, o
Canal principal de Olhão e adjacentes não sejam contemplados.
A
deslocalização das areias da intervenção da Armona, está mal fundamentada e a
ser executada levará a que no médio-curto prazo, seja a Ilha do Farol, em toda
a sua extensão a correr o risco de ruptura, pelo que a mitigação de riscos para
alem de mal identificadas, estão mal fundamentadas.
Assim
o Plano de Valorização Hidrodinâmica da Ria Formosa e de Mitigação de Riscos
para as Ilhas-Barreira, NÃO SATISFAZ!
Com
os meus respeitosos cumprimentos, sou
Antonio
Manuel ferro Terramoto